sábado, 2 de abril de 2005

O mundo em luto

O Papa morrera. Já o Camerlengo fizera a proclamação. O Mestre-de-Cerimônias, os notários e os médicos já o haviam consignado, sob atestado, à Eternidade. O seu anel fora dissolvido e os seus selos quebrados. Os sinos haviam dobrado por toda cidade. O cadáver do Pontífice fora entregue aos embalsamadores, para que se convertesse em objeto de veneração dos fiéis. Agora, encontrava-se entre círios brancos, com a Guarda Nobre em fúnebre vigília, sob os afrescos do Juízo Final, de Miguel Ângelo, na Capela Sistina.


O Papa morrera. Amanhã, todo o Clero da Basílica viria buscá-lo, para expor ao público na Capela do Santíssimo Sacramento. Seria enterrado no terceiro dia, revestido de seus paramentos de grande pontifical: mitra na cabeça, um véu púrpuro sobre o rosto, e um manto vermelho, orlado de arminho, para o manter quente na cripta. As suas condecorações e as moedas que mandara cunhar seriam enterradas com Ele, para sua identificação, se viesse a ser exumado mil anos depois. Seria encerrado em três urnas: uma, em madeira de cipreste; a segunda, de chumbo, para isolar da umidade e preservar-lhe o brasão e a certidão de óbito; a última, de olmo, para que se assemelhasse, pelo menos, aos outros homens que vão para a sepultura em caixões de madeira.


O Papa morrera. Por ele rezariam, agora, como por qualquer outro mortal: "– Não julgueis, Senhor, os Vossos Servos... Saivai-o da Morte Eterna." Baixá-lo-iam, depois, à gruta situada sob o Altar-Mor, onde, talvez, mas apenas talvez, se misturaria em poeira à poeira de Pedro; um pedreiro emparedaria o túmulo e fixaria uma lápide de mármore com Seu Nome, o seu título e as datas de seu nascimento e morte.


O Papa morrera. Seria sufragado com nove dias de missa e nove absolvições, das quais, tendo sido em vida maior distribuidor que os outros homens, mais necessitaria após a morte.


Depois, seria esquecido. O Trono de Pedro achava-se vazio, e a vida da Igreja estava em compasso de espera, e o Todo-Poderoso sem representante neste agitado planeta.


WEST, Morris. As Sandálias do Pescador.

Um comentário:

  1. Anteontem mesmo assisti o filme e lembro da época em que li o livro.
    Só eu que não posso ser eleito, ainda estou no seminário dos letristas (com sopa e tudo) arrependidos...

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